Rede almeja ser um espaço plural de conexão e visibilidade para o cinema brasileiro feito por mulheres indígenas
O cinema de temática indígena tem ganhado espaço nos festivais, nas mostras audiovisuais e em salas de exibição brasileiras e internacionais. Da ficção ao documentário, os filmes produzidos pelos povos originários são, em sua maioria, sociopolíticos e se colocam como ações de reconhecimento comunitário, por justiça climática e de luta pela terra.
Na leitura de Graciela Guarani, cineasta da etnia Guarani Kaiowá, considerada uma das pioneiras na produção audiovisual indígena, esse cinema ainda é estatisticamente invisível, sobretudo o feito por mulheres. Para ela, é necessário pensar políticas para impulsionar o meio audiovisual indígena e, assim, fortalecer a luta dos povos originários.
Impulsionar o audiovisual indígena é justamente o que pretende a Katahirine, a primeira rede audiovisual de mulheres indígenas do Brasil, lançada no final de abril. A rede foi concebida pelo Instituto Catitu, organização que atua junto aos povos originários para o fortalecimento e protagonismo de mulheres e jovens na defesa de seus direitos.
“A ideia da rede é criar um espaço onde essas mulheres possam mostrar seus trabalhos e o público possa conhecê-las”, explicou Mari Corrêa, cineasta responsável pela coordenação do projeto, durante evento de lançamento.
Segundo Sophia Pinheiro, uma das organizadoras da Katahirine, o projeto é resultado de um longo processo e de alianças de trabalho e afetivas entre indígenas e não indígenas. Em sua pesquisa de doutorado para PPGCine-UFF, Sophia deu o pontapé inicial para a criação da rede com o mapeamento de cineastas indígenas brasileiras. Com esse trabalho em mãos, a ação de lançamento da Katahirine foi a criação de um site, que abriga as produções audiovisuais, além de uma biblioteca de artigos acadêmicos sobre o tema e a biografia com os rostos dessas mulheres e informações sobre suas trajetórias.
A rede também pretende ser uma ferramenta de conhecimento e diálogo entre as artistas, além de uma referência para pesquisas sobre o cinema indígena feminino.
Futuramente, o grupo planeja expandir internacionalmente e promover encontros entre as realizadoras e mostras de exibição dos filmes. A Katahirine deve atuar, ainda, no desenvolvimento de estratégias de fortalecimento do audiovisual indígena e na proposição de políticas públicas que atendam a produção do cinema feito por mulheres.
CONSTELAÇÃO
Katahirine, uma palavra da etnia Manchineri, significa constelação. O nome da rede faz alusão a pluralidade e conexão entre essas mulheres de diversas origens e estágios de trabalhos – há desde cineastas com produções consolidadas no cinema, à iniciantes que estão dando os primeiros passos por de trás das câmeras.
Como um “encontro de gerações”, a rede é a primeira a iniciar estatísticas sobre mulheres indígenas no audiovisual. Os dados poderão ser usados, por exemplo, para diagnosticar em quais cidades e regiões são as prioritárias para desenvolver programas de formação audiovisuais.
Até o momento, participam da rede 75 mulheres de 32 etnias diferentes, representando os seis biomas brasileiros: Amazônia (15), Caatinga (7), Cerrado (16), Mata Atlântica (18) e Pampa (1). O único bioma sem representação, ainda, é o Pantanal. A Katahirine abriga nomes como Graci Guarani e Olinda Wanderley Yawar Tupinambá, diretora e codiretora do projeto Falas Da Terra da Rede Globo, respectivamente, e Patrícia Ferreira Pará Yxapy, diretora de filmes que já participaram de festivais no Brasil e no mundo. Zahy Tentehar, performer, cineasta, atriz e ativista do povo Tentehar-Guajajara – e uma das protagonistas da segunda temporada da série “Cidade Invisível” da Netflix – também integra a rede.
FOTO DE ABERTURA: Filme Karaiw a’e wà, de Zahy Tentehar