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As estripulias musicais de Assucena

04/04/2022

Mulher em cima de uma banqueta cinza cheirando uma flor branca. Ela está em pé e usa brincos grandes laranjas e uma roupa felpuda de várias cores, como laranja, vermelho, azul, amarelo e rosa. O fundo é uma janela de casa com desenhos colados, uma porta e uma parede descascada

Em entrevista exclusiva, Assucena fala dos próximos trabalhos, dos desafios de se lançar na carreira solo e de sua música de estreia, “Parti do Alto”

Nascida em Vitória da Conquista, na Bahia, Assucena encantou os brasileiros nos últimos seis anos de carreira. A cantora, que faz parte de uma cena em expansão de artistas LGTBQIAP+ no Brasil, começou a sua trajetória na música ainda durante a faculdade de História na Universidade de São Paulo (USP), com a banda “Preto Por Preto”, que depois se tornou “As Bahias e a Cozinha Mineira” e, por fim, “As Baías“. 

O trio, que também tinha Raquel Virgínia e Rafael Acerbi, lançou o seu primeiro álbum em 2015, e foi reconhecido com indicações ao Grammy Latino (2019 e 2020) e duas vitórias do Prêmio da Música Brasileira em 2018 (Melhor Grupo e Melhor Álbum).

Na virada de 2021 para 2022, Assucena decidiu dar voz à sua loucura e revelar uma intimidade vocal que nunca apresentou ao público antes. Cheia de “borboletas na barriga”, a artista subiu aos palcos em dezembro com o seu primeiro projeto, o show “Rio e Também Posso Chorar”, uma homenagem aos 50 anos do disco “Fatal” de Gal Costa

Logo depois, em janeiro, lançou “Parti do Alto”, primeiro single da sua nova fase. Ela ainda apresentou o show “Minha Voz e Eu” e corre para aprontar o primeiro álbum. 

Vou inaugurar tudo: meu nome, minha imagem, minha equipe, minha sonoridade, meu canal, minhas derrotas e vitórias. Sabe as borboletas na barriga? Já desisti de que elas vão desaparecer. Elas já são uma fauna permanente de minha flora intestinal

Em entrevista exclusiva à Emerge Mag, ela revela como tem sido esse recomeço, fala sobre a música “Parti do Alto”, que mescla cores pop com a densidade lírica de uma compositora pensante e inquieta, e comenta sobre as influências do movimento antropofágico. Confira, abaixo, a entrevista completa.

Qual é o principal desafio de se lançar em uma carreira solo? 

A decisão veio de uma busca pelo autoconhecimento. Não é só solidão, também é solitude. Em um projeto coletivo, é necessário renunciar muito de si para que o coletivo aconteça. Cheguei em uma fase da vida em que sinto necessidade de renunciar menos, e a arte dá essa possibilidade de ser responsável pelas minhas escolhas, sem jogar nos ombros do coletivo. Os acertos são meus, mas os erros também. 

Qual é a principal diferença de “Parti do Alto” para os seus outros trabalhos?

“Parti do Alto” é integralmente solo e essa busca é muito interessante, porque fui me reconhecendo nas escolhas. A música tem uma irreverência que eu não tinha gravado até então, e uma postura moderna, contemporânea, entre o sintetizador e a quebra para um samba melancólico.

Como encontrar o equilíbrio ao explorar um tom crítico sem cair no panfletarismo?

A militância exacerbada é necessária, pois tem possibilitado a quebra de muitos ismos negativos em prol de uma sociedade mais igualitária. Mas é necessário ter cuidado. Todo extremo é perigoso e não seria diferente com a arte. Não se pode abrir mão das figuras de linguagem, das metáforas.

Como o movimento antropofágico te influencia?

A antropofagia é própria do Brasil. Os modernistas e tropicalistas conceituaram o que é uma uma percepção histórica de um país fruto de uma colonização extremamente violenta. Nada que é do Brasil é próprio do Brasil, tudo partiu de um encontro. A gente tem que lidar com os traumas de uma nação que engole tudo que vem de fora, até porque destruímos muito do que existia dos povos originários. O rock, o jazz, o samba, o bolero, tudo vem de fora, mas também é nosso, porque tudo que engolimos vira outra coisa.

“O Brasil tem um jeito diferente de engolir as coisas e regurgitar, ou cagar”

O que você pode adiantar das “outras estripulias musicais” que você anda preparando em estúdio?

Vem um disco por aí e também quero lançar uns singles. Tenho uma homenagem para Elis Regina que já está gravada (em 2022, faz 40 anos que a cantora morreu). Apesar de estarmos em um ano difícil, precisamos mirar no Brasil bonito, com esperança. Fazer um disco em 2022 não vai ser fácil, mas ainda sim eu vou entrar no estúdio pra trazer uma sonoridade mais otimista, ainda que melancólica. 

FOTOGRAFIA: Divulgação

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