Reportagem de Camila Santana Quaresma, Daniel Pahl Camargo, Giovanna Elis Nascimento Dantas, Ingrid Riedel Pereira (RA 819120109), Kaique Santos Maia e Thais Benica, alunos do curso de Jornalismo da Universidade São Judas Tadeu, parceira da Emerge Mag.
Ilustradores negros dão nova cara e narrativa à cultura geek, dominada por personagens e criadores brancos e ocidentais
Quem abre uma revista em quadrinhos e a folheia em busca de grandes histórias e aventuras, talvez nem perceba que existe um problema recorrente na cultura geek: a falta de representatividade negra e africana. Nesse universo fantástico, dominado por personagens brancos e ocidentais, encontrar um único herói negro ou heróina negra é como descobrir uma pérola rara no meio de um vasto oceano.
Mity Dias e Marília Marz, ilustradoras e quadrinistas independentes, buscam mudar esse cenário, representando pessoas pretas em suas obras autorais. O propósito, elas contam, é mudar a vida das novas gerações com personagens que de fato reflitam suas feições.
Embora existam personagens negros em algumas séries de TV, filmes, quadrinhos e jogos, como a Tempestade dos “X-Men”, o Finn de Star “Wars episódios VII, VIII, IX” e o caçador de vampiros Blade, via de regra, personagens negros são estereotipados na cultura geek como gangsters ou bandidos, sub-representados ou utilizados de maneira secundária, cuja a única finalidade é dar blackwashing (maquiagem) a uma produção.
A falta de diversidade na frente da tela, atravessa até os bastidores. Poucos são os criadores, escritores, diretores ou produtores de conteúdo negros no segmento geek. O que por sua vez, leva a uma falta de compreensão e sensibilidade em relação às experiências e perspectivas dos personagens negros que venham a ser retratados.
Marília afirmar ser desanimador notar que não há referências negras no topo da cadeia editorial. Autora da história em quadrinhos “Indivisível”, uma narrativa sobre a cultura negra e leste asiática no bairro da Liberdade, em São Paulo, ela pergunta: “Até que ponto depende de mim? Meu objetivo não é ser desenhista da Marvel, mas se fosse, confesso que não sei se é possível chegar lá. Existem algumas mulheres que chegaram próximo, mas não lá”.
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A reportagem conheceu Mity e Marília, na última edição da PerifaCon, evento que reúne diversos fãs da cultura Geek na periferia para prestigiar justamente a arte nerd feita na periferia paulista.
Mity destacou a diferença do evento para outras feiras geeks, cheias de quadrinistas brancos, heterossexuais e cisnormativos. “Participar de uma experiência dessas fez eu me sentir em casa. As pessoas de lá me fizeram sentir como semelhante o tempo todo e saber que o lugar onde estava existe para fazer a diferença na vida de todas as pessoas”, conta Mity.
A representatividade negra na cultura geek tem sido assunto recorrente de debate e ganhou destaque quando da estreia de “Pantera Negra”, filme da Marvel que apresenta um elenco predominantemente negro. O filme não só se tornou um enorme sucesso de bilheteria, mas também inspirou um senso de orgulho e empoderamento em pessoas negras em todo o mundo. Com personagens fortes e bem desenvolvidos, a história retrata uma visão positiva e poderosa da cultura negra e africana. #WakandaForever
“Quando eu era criança eu tinha uma boneca Barbie preta e na época eu não soube dizer por que eu gostava mais dela do que das outras bonecas [brancas]. Hoje eu vejo que tinha mais afeição por ser parecida comigo e isso ser, na verdade, uma questão de representatividade”.
Apesar disso, a presença de protagonistas negras nas telas e quadrinhos ainda parece ser um problema para alguns. A escolha de Halle Bailey, uma mulher negra, para o papel de Ariel na adaptação em live-action de “A Pequena Sereia”, gerou uma onda de racismo nas redes sociais. Muitas pessoas questionaram a decisão da Disney de escalar uma atriz negra para um papel originalmente representado por uma personagem branca. Tamanha mobilização pelo inverso, nunca se viu.
Mas tal posição, só reforça a importância de continuarmos a discutir e trabalhar para alcançar uma maior diversidade e inclusão em todas as produções culturais. #FogoNosRacistas
O anseio de se ver retratado fez, desde criança, o designer e ilustrador Anderson Awvas, criar personagens negros podereosos. Ele é idealizador do projeto cultural “Folclore BR: Uma Nova Visão” e autor de diversos quadrinhos, assim como do curta-metragem “Eu Sou Caipora”.
O quadrinista lembra que não basta ter quem faça, é preciso também ter quem consuma essas produções. Para ele, consumir o trabalho desses artistas é fundamental para a manutenção de seus projetos e para dar voz a uma comunidade que historicamente foi sub-representada.
E lança um desafio: ”Vá agora no seu streaming favorito e veja quantas obras com protagonismo negros ou de produtores não brancos você está de fato assistindo. Se houver mais de dois pretos, é porque você fez uma força bem grande para mudar sua lista de recomendações”.
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