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Peça “Senhora X, Senhorita Y” combate clássico machista do teatro

19/07/2022

Duas mulheres contracenando. Uma delas usa um macacão vermelho, cabelos longos cacheados soltos e está atrás de uma mesa pequena de madeira. Ela grita e olha para a mulher à sua esquerda e coloca um livro no rosto dela. A mulher da direita está de macacão azul claro e tem cabelo castanho preso em um rabo de cavalo. Está curvada para trás e tem uma feição estampada olhando para a capa do livro. Atrás das duas, uma parede com folhas verdes e flores rosas, de cor rosa claro.

Paráfrase da peça "A Mais Forte", do dramaturgo sueco August Strindberg, "Senhora X, Senhorita Y" se debruça sobre papéis da mulher na sociedade e traz para a cena o corpo lésbico.

Paráfrase da peça “A Mais Forte”, do dramaturgo sueco August Strindberg, “Senhora X, Senhorita Y” se debruça sobre papéis da mulher na sociedade e traz para a cena o corpo lésbico.

Duas mulheres olham contracenam e olham para a plateia. Uma delas usa macacão vermelho e tem cabelos cacheados castanhos soltos. Está com os braços juntos, como se segurasse um bebê imaginário, e olha com rosto desconfiado. A outra tem uma expressão como se estivesse sendo acusada. Usa calça azul clara e camisa azul escura. Tem cabelos castanhos presos em um rabo de cavalo. Aponta para si mesma e faz uma cara assustada. Está sentada em uma cadeira de madeira.
Ana Paula Lopez e Sol Faganello contracenam juntas em “Senhora X, Senhorita Y”

Considerada um dos clássicos do teatro, a peça “A Mais Forte” esbarra em um problema que persiste até hoje, mas que era mais frequente anos atrás: conta a história de duas mulheres, mas não foi escrita por nenhuma delas. Muito pelo contrário, o autor do espetáculo de 1889 era August Strindberg, um dramaturgo homem, branco e de meia idade. 

Como já podemos imaginar, o espetáculo tem forte conotação machista, a começar pela própria história, que traz duas mulheres rivalizando por causa de um homem. A personagem “Sra X” vê na mesa ao lado em uma casa de chá “Sra Y”, sua oponente artística e suposta amante do seu marido. Em um monólogo dramático, ela profere ofensas à rival, que fica a peça inteira calada. 

Mas e se o texto fosse montado agora, no século 21, com tantas discussões em torno do que é ser mulher? Como seria discutir as problemáticas do espetáculo junto com mulheres artistas LGBTQIA+

Estes foram alguns dos questionamentos que acompanharam o processo de criação do espetáculo “Senhora X, Senhorita Y”, que tem direção e dramaturgia de Silvana Garcia e montagem do coletivo feminino de multiartistas Damas Produções, formado por Ana Paula Lopez, Sol Faganello e Camila Couto.

Na história original, Strindberg põe em confronto duas mulheres, mas dá voz apenas a uma delas – à do lar, àquela que, mesmo supostamente traída, sai vitoriosa porque tem a seu favor a solidez da instituição do casamento -; é ela quem serve e, ao mesmo tempo, domina o marido. Ambas são atrizes, porém, no texto, limitam-se aos papéis de mulher e amante, e só existem porque estão referidas a um homem.

No trabalho da “Damas Produções”, as artistas se debruçam sobre alguns dos papéis que a mulher desempenha na sociedade contemporânea, investigando aspectos muitas vezes contraditórios de sua inserção social e política, de seus investimentos afetivos e dos agenciamentos simbólicos que as cercam. 

PEÇA “SENHORA X, SENHORITA Y” DÁ VOZ A PERSONAGEM E TRAZ PROTAGONISMO LÉSBICO

Para a equipe do “Damas Produções”, uma das principais problemáticas da ficção proposta por Strindberg é ter como foco a construção de um feminino domesticado e subalterno, que se revela dessa forma por meio da relação entre as mulheres.

Apesar de terem mantido o mesmo cenário e a mesma situação de início, o elenco feminino trouxe uma versão em que “Senhorita Y” tem voz e se opõe e se combina com “Sra X”, trocando constantemente de papéis com ela e atravessando o tempo. Dessa forma, o espetáculo fala das duas na intimidade, mas também delas no mundo. Atriz e produtora do espetáculo, Sol Faganello explica:

Escolhemos o clássico como material para montagem justamente para subvertê-lo, abrir as diversas possibilidades em torno do que é ser mulher e dar voz às diversas possibilidades de existências e vivências

Para desafiar o autor ainda mais, a peça rompe o padrão da heteronormatividade trazendo para a cena o corpo lésbico: o universo da cena se amplia, já não são mais apenas duas, ou três, mas muitas vozes. A atriz Ana Paula Lopez comenta:

Durante os ensaios, entendemos, através de nossos corpos, que seria intolerável reproduzir o discurso de um autor homem, de 1889. Ao contrário, nos moveu o enfrentamento desta dramaturgia, o desejo de questionar, dialogar e criar dispositivos que dessem conta de dar voz a uma equipe de mulheres criadoras da cena

Há 4 anos em cartaz, a peça foi apresentada em diversos teatros públicos de São Paulo, festivais de cultura, participou do Circuito Cultural Paulista pelo interior do Estado e ainda ganhou uma versão audiovisual durante o período da pandemia. Além disso, no ano de 2019, “Senhora X, Senhorita Y” foi indicada ao Prêmio Aplauso Brasil na categoria Melhor Dramaturgia.

O espetáculo volta aos palcos de forma presencial com apresentações gratuitas de 16 a 31 de julho, sábados e domingos, às 21h e 19h, consecutivamente. As apresentações acontecem por meio do Circuito Municipal de Cultura, promovido pela Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, no Teatro Arthur Azevedo, Teatro Paulo Eiró e Teatro Alfredo Mesquita.

SERVIÇO

Peça “Senhora X, Senhorita Y”
23/07 às 21h | 24/07 às 19h no Teatro Paulo Eiró
30/07 às 21h | 31/07 às 19h no Teatro Alfredo Mesquita
Gratuita, retirada dos ingressos 1h antes do espetáculo na bilheteria dos teatros

FOTOGRAFIA: Maria Fanchin

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