Paráfrase da peça “A Mais Forte”, do dramaturgo sueco August Strindberg, “Senhora X, Senhorita Y” se debruça sobre papéis da mulher na sociedade e traz para a cena o corpo lésbico.
Considerada um dos clássicos do teatro, a peça “A Mais Forte” esbarra em um problema que persiste até hoje, mas que era mais frequente anos atrás: conta a história de duas mulheres, mas não foi escrita por nenhuma delas. Muito pelo contrário, o autor do espetáculo de 1889 era August Strindberg, um dramaturgo homem, branco e de meia idade.
Como já podemos imaginar, o espetáculo tem forte conotação machista, a começar pela própria história, que traz duas mulheres rivalizando por causa de um homem. A personagem “Sra X” vê na mesa ao lado em uma casa de chá “Sra Y”, sua oponente artística e suposta amante do seu marido. Em um monólogo dramático, ela profere ofensas à rival, que fica a peça inteira calada.
Mas e se o texto fosse montado agora, no século 21, com tantas discussões em torno do que é ser mulher? Como seria discutir as problemáticas do espetáculo junto com mulheres artistas LGBTQIA+?
Estes foram alguns dos questionamentos que acompanharam o processo de criação do espetáculo “Senhora X, Senhorita Y”, que tem direção e dramaturgia de Silvana Garcia e montagem do coletivo feminino de multiartistas “Damas Produções”, formado por Ana Paula Lopez, Sol Faganello e Camila Couto.
Na história original, Strindberg põe em confronto duas mulheres, mas dá voz apenas a uma delas – à do lar, àquela que, mesmo supostamente traída, sai vitoriosa porque tem a seu favor a solidez da instituição do casamento -; é ela quem serve e, ao mesmo tempo, domina o marido. Ambas são atrizes, porém, no texto, limitam-se aos papéis de mulher e amante, e só existem porque estão referidas a um homem.
No trabalho da “Damas Produções”, as artistas se debruçam sobre alguns dos papéis que a mulher desempenha na sociedade contemporânea, investigando aspectos muitas vezes contraditórios de sua inserção social e política, de seus investimentos afetivos e dos agenciamentos simbólicos que as cercam.
PEÇA “SENHORA X, SENHORITA Y” DÁ VOZ A PERSONAGEM E TRAZ PROTAGONISMO LÉSBICO
Para a equipe do “Damas Produções”, uma das principais problemáticas da ficção proposta por Strindberg é ter como foco a construção de um feminino domesticado e subalterno, que se revela dessa forma por meio da relação entre as mulheres.
Apesar de terem mantido o mesmo cenário e a mesma situação de início, o elenco feminino trouxe uma versão em que “Senhorita Y” tem voz e se opõe e se combina com “Sra X”, trocando constantemente de papéis com ela e atravessando o tempo. Dessa forma, o espetáculo fala das duas na intimidade, mas também delas no mundo. Atriz e produtora do espetáculo, Sol Faganello explica:
Para desafiar o autor ainda mais, a peça rompe o padrão da heteronormatividade trazendo para a cena o corpo lésbico: o universo da cena se amplia, já não são mais apenas duas, ou três, mas muitas vozes. A atriz Ana Paula Lopez comenta:
Há 4 anos em cartaz, a peça foi apresentada em diversos teatros públicos de São Paulo, festivais de cultura, participou do Circuito Cultural Paulista pelo interior do Estado e ainda ganhou uma versão audiovisual durante o período da pandemia. Além disso, no ano de 2019, “Senhora X, Senhorita Y” foi indicada ao Prêmio Aplauso Brasil na categoria Melhor Dramaturgia.
O espetáculo volta aos palcos de forma presencial com apresentações gratuitas de 16 a 31 de julho, sábados e domingos, às 21h e 19h, consecutivamente. As apresentações acontecem por meio do Circuito Municipal de Cultura, promovido pela Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, no Teatro Arthur Azevedo, Teatro Paulo Eiró e Teatro Alfredo Mesquita.
SERVIÇO
Peça “Senhora X, Senhorita Y”
23/07 às 21h | 24/07 às 19h no Teatro Paulo Eiró
30/07 às 21h | 31/07 às 19h no Teatro Alfredo Mesquita
Gratuita, retirada dos ingressos 1h antes do espetáculo na bilheteria dos teatros
FOTOGRAFIA: Maria Fanchin