Contexto histórico e visibilidade intersexo, o I da sigla LGBTQIA+

15/08/2024

Brasil é um dos poucos países com registro de pessoas intersexo em documentos. Museu da Diversidade Sexual está com exposição sobre o tema.

Entre 2014 e 2021, o Brasil registrou 104.557 recém nascidos com “sexo ignorado” — 1,6% do total de bebês registrados no período, de acordo com o DataSUS. Antes vistas com uma condição a ser “corrigida”, pessoas intersexo são aquelas que possuem características sexuais (genitais, padrões cromossômicos e glândulas) que não permitem, logo no nascimento, a categorização em “masculino” ou “feminino”.

As pessoas intersexo têm excesso ou deficiência de ação dos hormônios sexuais, seja o estrógeno, mais presente em mulheres, ou a testosterona, maior em homens. Diferentemente das demais letras, que representam orientações sexuais e identidades de gêneros, o I da sigla LGBTQIA+ é uma questão estritamente biológica, e talvez uma das menos visibilizadas e debatidas.

LEIA TAMBÉM: Numa sociedade obcecada por sexo, como é ser assexual?

No entanto, há muita gente intersexo no mundo. Em 2017, o Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, estimou que entre 0,5 e 1,7% da população mundial é intersexo. Aplicando a taxa na população nacional, dá para dizer que até 3,5 milhões brasileiros são intersexo.

O ponto positivo da realidade brasileira é que o Brasil foi o segundo país a reconhecer uma pessoa intersexo, a ativista pernambucana Céu Albuquerque, aos 33 anos, em 2021, de acordo com Associação Brasileira Intersexo.

Já em dezembro de 2023, foi instalado oficialmente o Grupo de Trabalho Intersexo, no Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. O objetivo do grupo é produzir relatório final, no prazo de 12 meses, com estratégias para a promoção e defesa dos direitos humanos das pessoas intersexo e com variações das características sexuais no Brasil, para proposição de políticas públicas em direitos humanos sobre o tema. Além disso, desde fevereiro de 2024, a Receita Federal passou a incluir no seu cadastro opção de intersexo em registro de CPF.

MUSEU DA DIVERSIDADE SEXUAL: primeiro da América Latina e um dos três do mundo dedicado às comunidades LGBTQIA+

LEIA MAIS: O que é pansexualidade?

EMÍLIA É HOMEM

Até pouco tempo, nascer intersexo motivava, na maioria das vezes, intervenções cirúrgicas e hormonais invasivas e sem consentimento, principalmente em bebês e crianças. Com a maior conscientização sobre os direitos humanos das pessoas intersexo, o tema tem sido debatido em diferentes frentes, desde na mídia tradicional às artes.

Com o propósito de preservar a memória e produzir estudos sobre diversidade sexual e de gênero, o Museu da Diversidade Sexual, no centro da capital paulista, reabriu as portas em maio. O museu é o primeiro dedicado a cultura LGBTQIA+ da América Latina e um dos únicos três no mundo. Os outros são o Schwules Museum, em Berlim (Alemanha), e The GLBT History Museum, em São Francisco (EUA). O espaço conta com exposições fixas e temporárias.

O museu abriga fotografias, vídeos, pinturas e outras produções de artistas pertencentes a comunidade. O acervo é dedicado a trajetória, a luta pela dignidade humana e promoção por direitos, o que o faz ser aparelho cultural para fins de transformação social.

Uma das exposições em cartaz é Pajubá: a hora e a vez do close. Há obras de mais de 100 artistas, que revelam desde personagens históricos na construção política e estética das comunidades até vozes da arte contemporânea, que reivindicam, a dignidade e importância das dissidências de gênero.

A obra é Emília é Homem é parte da exposição. A criação nasce de uma matéria de jornal que conta a história de uma pessoa intersexo, em Minas Gerais, que em seu nascimento foi designada como mulher, mesmo com condições genéticas dúbias. No entanto, ao longo dos anos, Emília passou a desenvolver traços ditos masculinos, e a se identificar como um homem, passando a se chamar David. Também está disponível na exposição o livro e cartaz da peça O Patinho Torto, que dramatiza a história de David.

Amara Moira, coordenadora de educação, exposições e programação cultural do Museu da Diversidade Sexual, conta que o registro histórico de pessoas intersexo garantem sua existência na sociedade e validação de suas experiências.

“A preservação e exposição de obras e documentos históricos sobre pessoas intersexo é essencial para garantir visibilidade, educação e conscientização sobre o tema, além de resguardar a história”

Amara Moira, coordenadora do Museu da Diversidade Sexual

SERVIÇO
Museu da Diversidade Sexual
Estação República do Metrô (Piso Mezanino). Rua do Arouche, 24, São Paulo
De terça a domingo, das 10h às 18h
Gratuito. Ingressos aqui.

Foto de abertura: Alexander Grey/Unsplash

Quem escreveu

Picture of Guilherme Schanner

Guilherme Schanner

Graduado em jornalismo pela Universidade Mackenzie, gosta de escrever e falar sobre cultura e sustentabilidade. Apaixonado pela natureza, é líder escoteiro desde a infância. Com experiência em produção e edição de conteúdo digital, trabalhou no Fala! Universidades.

Inscreva-se na nossa

newsletter

MATÉRIAS MAIS LIDAS

ÚLTIMAS MATÉRIAS

NEWSLETTER EMERGE MAG

Os principais conteúdos, debates e assuntos de cultura, direitos humanos e economia criativa interseccional no seu e-mail. Envio quinzenal, às quartas-feiras.