Para quem nunca tocou nem flauta de plástico no pré-primário, tocar um tambor pode parecer uma missão difícil, ainda mais quando a percussão se dá numa ciranda de mulheres comandada por Ariane Molina.
A jovem antropóloga é fundadora do coletivo Mbeji, que significa Lua e Ancestralidade em Kimbundo, um idioma de origem Banto – grupo etnolinguístico originário da região da África subsariana que engloba cerca de 400 subgrupos étnicos diferentes.
Para proporcionar práticas musicais femininas e ritualizar laços ancestrais, o coletivo desenvolveu o projeto Tambores Femininos de Mbeji.
A iniciativa consiste numa série de encontros exclusivo para mulheres.
A proposta é usar a percussão para fazer com que elas se conectem consigo mesmas e com suas origens por meio do fortalecimento do sagrado, do profano e do selvagem feminino.
As oficinas acontecerão todas segundas-feiras do mês de setembro no Jardin do Centro, espaço no centro da capital paulista que reúne floricultura, cafeteria e restaurante e que também abriga coworking, auditório e salão de eventos.
Foi num desses encontros que me deparei com um tambor pela primeira vez.
Logo no começo da aula, começo a perder o medo do instrumento. Como quem não quer nada, sinto o peso do casco e arrisco umas leves batucadas na membrana esticada no topo.
Começo a seguir as orientações da professora, agora já chamada de Ari por mim e mais uma dezena de alunas de diferentes perfis – uma das participantes, por exemplo, era deficiente visual.
Além da percussão, também passamos a entoar cânticos, em sua maioria de matriz afro-brasileira e cantigas de ritos que são tradicionalmente conduzidos por mulheres.
Percebo que um ritual se inicia. Ouvir a minha voz junto as de outras mulheres é um convite para caminhar por meus próprios caminhos internos.
Entre uma canção e outra, Ari levanta questões importantes sobre protagonismo feminino, conexão com a natureza e diversidade cultural brasileira.
Neste momento, minha atenção se divide entre a professora, o instrumento e as mulheres ao meu redor.
Assim como elas, eu também estou abraçando com as pernas um tambor da metade do meu tamanho.
Sinto a ressonância de cada batida em meu corpo e em minha mente, principalmente.
Parece que nossas vozes e o estalar das mãos criam uma energia que circula por todo o ambiente.
Percebo que não é apenas eu que toco o tambor – o tambor também toca em mim.
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SE ESSE É O LUGAR, ENTÃO AQUI ESTOU
Graduada em Ciências Sociais, Ariane atua como pesquisadora de músicas religiosas afro-brasileiras e cubanas, protagonismo feminino no samba e manifestações musicais de matriz africana que influenciam a cultura do Brasil.
Cantora, percussionista e cuiqueira, Ariane fundou o Mbeji em 2004 para reunir outras musicistas e pesquisadoras e apresentar músicas de origem afro-brasileira, ameríndia e latina.
Ela também é fundadora do Bloco da Pombagira, uma extensão do Mbeji que promove a liberdade artística e musical feminina.
No próximo sábado (21/09), o bloco fará uma ensaio na Praça da Vila Buarque, localizada na frente do Jardin do Centro.
No domingo, será a vez das Pombagira cantar e dançar na Ocupação 9 de Julho, num evento com entrada gratuita.
E, para quem quer aprender a tocar tambor, inscreva-se nas aulas que acontecerão todas as segundas-feiras no Jardin do Centro, o café mais verde de São Paulo.
SERVIÇO
Mbeji
Coletivo de pesquisa em percussão e canto de música de ritual afro-brasileira e latina que oferece aulas de tambor às segundas-feiras, das 19h às 22h, no Jardin do Centro.
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Jardin Do Centro
Cafeteria e loja de plantas. Um pequeno oásis verde no centrão de São Paulo.
Rua General Jardim, 490, Vila Buarque – São Paulo (SP).
De segunda a sábado, das 9h às 20h, e domingo, das 10h às 17h.
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Diálogos e Café
Diálogos e Café é a nova editoria da Emerge Mag, fruto de uma parceria com o Jardin do Centro, que congrega a marca homônima; o Quintal do Centro; o Bento 43 e a Quadra 27. A parceria de mídia consiste, principalmente, na cobertura de eventos culturais, artísticos e de viés social de diferentes vertentes.
FOTOS: Kalinca Maki