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Irreverente, Burlesco sai dos palcos e invade livros

11/04/2022

Mulher deitada com as costas no chão e uma das pernas levantadas. Usa uma lingerie e sapatos de salto azuis e um cachecol de penas. Está com maquiagem azul, cabelos castanhos e olha para a câmera.

Dançarina Mirela Perez lança “A Semiótica do Burlesco”, em que narra um apanhado histórico das origens da dança criada por mulheres

A performance de Christina Aguilera e Cher no filme Burlesque, assim como o glamour da música Lady Marmalade, estrelada por Aguilera, Lil’ Kim, Mya e Pink, popularizaram a dança Burlesco no mundo todo. O estilo, que remonta ao século 16, surgiu na Europa como paródias de obras tradicionais da literatura e do teatro.

Capa de um livro com fundo preto e uma mulher olhando para a frente com um acessório de penas vermelhas na cabeça e luvas brilhantes. Tem cabelos lisos e castanhos e franjas. Abaixo, o título do livro e o nome da autora. Tem uma borda brilhosa branca
LIVRO “A SEMIÓTICA DO BURLESCO”, DE MIRELA PEREZ

No seu cerne, o Burlesco já tem como essência burlar um padrão, uma cultura. Mesmo há centenas de anos, mulheres usavam essa arte para questionar os padrões da época, a partir de brincadeiras com as técnicas de dança, teatro, circo e mágica. Atualmente, os pilares do Burlesco se mantêm firmes. E foi toda essa irreverência, além da beleza, cor e alegria, que fizeram Mirela Perez levar o Burlesco para uma área que parece ter pouca proximidade com a dança: a academia. 

Salto alto, brilho e muito glamour não é o que imaginamos encontrar nos corredores das universidades. Mesmo assim, estimulada por sua orientadora, a dançarina decidiu pesquisar o tema no mestrado e mais: transformá-lo em livro. Em 2022, lançou “A Semiótica do Burlesco” (compre aqui), em que traz um apanhado histórico das origens da dança, bem como uma análise semiótica detalhada sobre os elementos visuais que compõem o individual feminino, dividido em três: Glamour, Fetiche e Desconstrução.

Devido à escassez de material acadêmico sobre o tema, Mirela optou por fazer uma pesquisa de campo e entrevistar as responsáveis por dar vida à técnica: as alunas da Escola Burlesca de São Paulo.

Fundada em 2005, a Escola Burlesca de São Paulo é a primeira escola dedicada ao ensino da prática no Brasil. O negócio é gerido por Shaide Halim, mais conhecida por Lady Burly. Formada em Broadway Jazz, Jazz Clássico e balé, Shaide também é professora na escola, que conta com outras quatro mulheres no quadro de funcionárias. A proposta de valor – e o propósito – da escola é difundir a dança para profissionais e entusiastas da arte, sem esquecer dos conceitos históricos, sociais e intelectuais que compõem o universo do Burlesco.

A história do primeiro contato de Mirela com a escola é curiosa. Ela conta que marcou uma data para conhecer espaço e entrevistar Lady Burly. Porém, no dia marcado, a professora esqueceu da entrevista e achou que ela estava lá para fazer uma aula experimental. “Fiz a aula e a entrevista”, diz Mirela, aos risos. “Me apaixonei pela dança e não parei mais de frequentar a escola”.

Criado por mulheres, Burlesco enfrenta preconceito e machismo

Em seu artigo “De onde vem o Burlesco”, a artista Giorgia Conceição, conhecida como Miss G, revela que a história do que hoje chamamos de Burlesco é feita por “mulheres, freaks e marginais, artistas pouquíssimo valorizados, que formam um lado obscuro e pouco conhecido do teatro e das artes cênicas”.

Por isso, por mais que seja uma prática centenária, o Burlesco ainda é alvo de muitos olhares tortos e preconceituosos. Mirela chama atenção para o machismo que as dançarinas sofrem, principalmente por se tratar de uma performance sensual. Ela explica:

“O estereótipo associado as dançarinas tem origem numa educação religiosa deturpada, entre pessoas mal resolvidas com o próprio corpo e a sexualidade. O Burlesco é um espelho que obriga as pessoas a enxergar algo que elas ainda não estão preparadas para ver”

No meio conservador da academia, a artista enfrentou barreiras tanto psicológicas quanto práticas, como assédio moral e dificuldade em buscar revistas acadêmicas para publicar artigos sobre o tema, sobretudo de outros alunos. De acordo com Mirela, uma vez que o Burlesco é uma arte que aborda sensualidade, sexualidade e glamour, ele acaba adentrando o “hall das futilidades acadêmicas”. Assim, há certa estranheza e invalidação da pesquisa, em prol de uma “nobreza de aplicação de tema”.

Mirela ressalta, porém, que a técnica busca justamente o contrário: ajudar as pessoas a se enxergarem em todas as suas multiplicidades e facilitar a jornada de autodescoberta e empoderamento, assim como fez com ela.

“O Burlesco devolveu minha autoestima e me deu controle sobre o meu corpo e minha sexualidade”, conta.

APRESENTAÇÃO DA ESCOLA DO BURLESCO: DANÇA É SOBRE AUTOESTIMA E CONTROLE DO PRÓPRIO CORPO

IMAGENS: Divugação

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