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Gasolina neles e vaselina nelas: Teto Preto e Jup do Bairro em jogos de “phoder”

19/07/2024

Teto Preto, referência da música eletrônica brasileira, e Jup do Bairro, a cantora ícone LGBTQIA+, entregam união potente e ácida.

Em 2024, o Teto Preto completa 10 anos. Para todes da atual formação, há um consenso: a banda está no seu melhor momento. O grupo, formado por Laura Diaz (Carneosso) Matheus Câmara (Entropia) e Marian Sarine (Sarine), é uma das grandes referências da cena da música eletrônica de São Paulo.

Há poucas semanas, a banda lançou Te Colocar No Teu Lugar (veja clipe abaixo), nova música que fala sobre jogos de “phoder”, como conta Laura. A compositora escreveu a música após um término de relacionamento, num momento de bagunça, prazer e de entender o lugar das pessoas e as suas contribuições na sua vida. A canção aborda territórios, ocupação de lugares e afetos por meio da sensualidade.

“Os afetos são revolucionários, celebrar é revolucionário. Precisamos dessa alegria”.

Laura Diaz, a Carneosso

Te Colocar No Teu Lugar não é explicitamente política, como outros lançamentos da banda. Traz um clima festivo, tanto da pista quanto como elemento folclórico e cultural. O resultado é uma liberdade que se expressa na letra e na sonoridade. “Não estamos dando um murro na cara, mas um tapa de luva”, diz Matheus.

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Um dos pontos altos da música é a participação da cantora Jup do Bairro. E quais as semelhanças entre você e o Teto Preto, Jup? “Inquietude, doçura, acidez, tesão, mal humor, carisma, força, contradição, contra a tradição”, responde ela. “Somos 8 e 80 mesmo”. Para Jup, a música é ao mesmo tempo divertida e tragicômica – os ossos do ofício de se relacionar com uma pessoa babaca, mas 10/10 na cama.

“Toca uma pra mim? Hum… aquelas. Gasolina neles e vaselina nelas”

Jup do Bairro, em Te Colocar No Teu Lugar

Tanto para Jup quanto para o Teto Preto, Te Colocar No Teu Lugar simboliza um longo percurso no cenário das artes pós pandemia. No último ano, a agenda de shows e festivais voltaram, porém tem acontecido cancelamentos de eventos, que muitas vezes trazem sempre as mesmas atrações. Dessa forma, as artistas criam outras possibilidades para trabalhar, num movimento que passa pelo apoio de parceiras novas e antigas, múltiplos diálogos e resistência de um cenário alternativo que conseguiu se solidificar. Para Jup, o lançamento da música precisa ser celebrado pelos fãs e aliades.

“Continuamos acreditando que a música pode ser uma das principais ferramentas de transformação sociocultural”, afirma Jup.

JUP DO BAIRRO: cantora contradição e contra a tradição

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DAS FÁBRICAS ABANDONADAS PARA A TIMES SQUARE

O Teto Preto teve início e ganhou destaque com a união de artistas que orbitavam a Mamba Negra, festival de música eletrônica, feito por e para mulheres e LGBTQIA+, que Laura cofundou em 2013. E o clipe de Te Colocar No Teu Lugar é carregado de símbolos de união.

O clipe conta a história da Mamba pelas mãos de quem a constrói. O vídeo mistura cenas da edição de 11 anos do festival, realizada em maio, com momentos gravados em estúdio. As transições obedecem a identidade cromática da festa. A produção é uma parceria com o diretor e fotógrafo Hick Duarte. “Ele trouxe a linguagem publicitária, além da artística”, conta a vocalista da banda.

A narrativa do filme é um plano para hackear a Times Square. Há vários agentes com pendrives espalhados por diferentes ambientes, que vão desde um quarto hacker e uma sala de aula ao ambiente da Mamba Negra. Cada pendrive possui o vírus Teto Preto, que acaba se disseminando em diferentes pistas ao redor do mundo – numa ode à resistência, afirmação pelo talento e senso de comunidade.

“O grande trunfo do clipe é borrar os limites entre o ficcional e o documental”

Hick Duarte

O clipe também tem várias referências à cultura pop, transitando desde Gretchen e Caroline Polachek a Missy Elliott. Outra referência é o Shibari, arte japonesa de amarração erótica e sensorial, presente em figurinos por exemplo.

A coreografia é assinada por Augusto Follman. Os dançarinos principais são Eva Bessa, também bailarina da cantora Majur, e Puri Yagurete – ambas pessoas trans, que são casadas na vida real. O corpo de baile do clipe tem origem nos shows ao vivo do Teto Preto, em que também participam Bruxa Cósmica, Aryen e Juana Chi (coreógrafa). As coreografias são partituras, cenas, dança e improviso.

“Não somos um ballet de coreografia de TikTok. Somos uma frente performática. Um coro explosivo de corpas livres convulsivas”

LAURA DIAZ
PURI YAGURETE, LAURA DIAZ E EVA BESSA: corpo de baile distópico

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OS CÃES LADRAM E ELAS NÃO PARAM

Lançado no dia 31 de maio, o clipe e os conteúdos digitais relacionados a música têm sidos censurados em diferentes plataformas, como YouTube e Instagram. A música, por exemplo, ficou mais de um mês sem aparecer nos sistemas de busca e no perfil da banda, que tem sido alvo de denúncias e chegou a cair no Instagram. “Contatamos a Meta, mas não houve retorno definitivo”, diz Laura.

O episódio reflete um momento delicado vivido por bandas e projetos que não estão alinhados a cultura de massa e grandes conglomerados musicais, das grandes empresas e gravadoras. Mas as coisas hão de melhorar, pois o Teto Preto não vai parar.

Te Colocar No Teu Lugar é o primeiro single do novo álbum da banda. O lançamento está previsto para setembro, com participação de artistas como Saskia, Getúlio Abelha e Thiago França, além de Jup do Bairro.

O trabalho está sendo gestado desde 2020. Parte das músicas já foram tocadas em shows da banda. “Quem viu um show da banda dois anos atrás e viu o último vai entender a construção e evolução das músicas”, explica Matheus. Ele conta que é um disco com muitos extremos e que passa por diferentes gêneros. Enquanto o primeiro single trabalha mais uma latinidade, os demais trazem outras harmonias, com presença de guitarras e synths distorcidos.

Laura comenta que todas as músicas são muito diferentes entre si. “Mas todas são hits”, diz. Ela reforça a competência e profissionalismo do projeto, que traz o que há de melhor dentro da cena LGBTQIAPN+. A equipe é formada pessoas que estão em grandes produções do pop e que, agora, contam a sua própria história.

Edição: Italo Rufino
Fotografias: Divulgação

Quem escreveu

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Antônio Moraes

Um paulista-mineiro movido por cultura, esportes, gastronomia e espírito urbano. Graduado em jornalismo pela Universidade Federal de Minas Gerais, com passagens pelo Instituto Cultural Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG Cultural) e Livraria da Travessa.

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