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O que é pansexualidade?

29/08/2021

Termo é usado por pessoas que não limitam suas escolhas amorosas ao gênero e sexualidade do parceire. É aquele lance "gostar de pessoas".

*Esta reportagem contém linguagem neutra de gêneros gramaticais.

Nos últimos meses, vários famosos têm se assumidos pansexuais. Constam na lista Janelle Monaé, Miley Cyrus, Preta Gil, a influencer Bianca Andrade e Reynaldo Gianecchini. Na época que trouxe o tema a público, o ator global afirmou: “dizem que sou gay, mas não me considero assim; eu me considero tudo ao mesmo tempo, se existir uma palavra para mim, então é ‘pan'”.

Como uma boa jornalista também graduada em Letras, começo explicando o que é pansexualidade por sua morfologia. O prefixo grego “pan-” se refere a “todos” ou “tudo” e, quando unido à “sexual”, é compreendido como algo próximo a “alguém que se sente atraído por pessoas de todos os gêneros”. Porém, a definição exata da pansexualidade varia entre as pessoas e as organizações da comunidade. O grupo “Pansexuality is Perfect” define como “não ser limitade ou inibide na escolha sexual com relação ao gênero ou atividade”.  O grupo complementa:

“Pansexualidade significa que você tem a capacidade de estar com qualquer pessoa, mas não significa que estará com qualquer pessoa”

A ONG americana Gay & Lesbian Alliance Against Defamation coloca a pansexualidade sob o guarda-chuva da bissexualidade, a conceituando como “ser atraído por pessoas de todos os gêneros e sexo ou que independe do sexo ou gênero”. Em resumo, podemos dizer que uma das partes fundamentais da identidade pansexual é a não dependência do gênero. Ou seja, a atração independente do sexo ou gênero da própria pessoa, que pode gostar de homens cis/trans, pessoas agênero, pessoas intersexo, pessoas genderqueer – ou de qualquer outro gênero não-binário –, mulheres trans/cis, ou qualquer outra combinação de sexo, gênero ou expressão de gênero. Ou seja, pouco importa o que existe entre as pernas; a atração surge por outros aspectos que independem disso.

TIVISTA COM A BANDEIRA DA PANSEXUALIDADE NA PARADA LGBT 2021 DE BERLIM (Foto: Lucas Werkmeister)

PANSEXUALIDADE VS BISEXUALIDADE

Uma das principais discussões que norteia a pansexualidade é a diferença para a bisexualidade. Mas já adianto que é incorreto dizer que a última é uma definição binária, já que o prefixo “bi-” traz a ideia de “dois” e “duplo”. De acordo com u criador de conteúdo digital Nick Thomás, a definição de bisexual mudou (bastante) ao longo dos tempos e nunca foi sobre gostar de dois gêneros; tese defendida por outros especialistas, como a professora de linguística da Universidade Federal do Estado de Rio de Janeiro Elizabeth Lewis.

No livro “A História da Bissexualidade”, Steven Angelides afirma que a bissexualidade é um terceiro elemento de categorias binárias e dicotômicas de sexo, gênero e sexualidade. Nick complementa dizendo que “a bissexualidade sempre foi estar fora de um binário, quebrar o binário e construir narrativas e possibilidades para além disso”.

Por sua vez, página Vale dos Pans diz que os dois movimentos cresceram paralelamente e nenhum veio para substituir, invisibilizar ou invalidar o outro – e ambos não excluem pessoas trans e/ou não-binárias. Um post da página explica:

“A bissexualidade não é transfóbica, assim como a pansexualidade não é bifóbica. Pessoas são bifóbicas e transfóbicas; as sexualidades não!”

Dessa forma, a diferença entre bi e pan tem mais a ver com fatores como o contexto histórico, social e político. Enquanto o movimento bi se consolidou por volta das décadas de 60 e 70, o pan se firmou entre os anos 80 e 2000. Mas vale lembrar que a sexualidade é fluida e que há várias formas de expressar ela. Ou seja, cada ume se identifica com que faz mais sentido para sua vida política e social.  

Eu, a repórter que vos fala, sou uma pessoa pansexual que há dois anos se identificava como bissexual. Hoje, diria que a importância da reivindicação do termo pan é subverter a visão que existe na cabeça das pessoas que só é possível existir relações entre homens cisgêneros e mulheres cisgêneras – pensamento que exclui pessoas trans, intersexo ou não-bináries. E falo isso por experiência própria. Desde que comecei a me declarar como uma pessoa pansexual, costumo ouvir: “o que é isso?”, algo muito raro de se escutar quando você fala que é bissexual.

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ORIGEM DO TERMO

O conceito pansexualidade começou a ser cunhado por volta de 1920 com o psicanalista Sigmund Freud e a publicação de seu livro “Além do Princípio do Prazer”, que explica concepções relacionadas à sexualidade e descreve a visão de que a maioria dos comportamentos humanos deriva de instintos sexuais. Quase 100 anos depois, no artigo “A Ressignificação do Discurso Pansexual: o Jogo do Também“, os autores Raphael Medeiros e Pedro Navarro explicam que a teoria do psicanalista foi fortemente reprovada na época da publicação, sendo atribuído a ela o termo pejorativo “teoria pansexualista de Freud”, que “reduziria tudo a sexo”.

Hoje, o termo pansexual tem pouco a ver com a definição do psicanalista e suas teorias psico-sexuais. A ideia contemporânea começou a tomar forma na década de 1990, quando houve crescimento das discussões sobre gênero e sexualidade, muito em resposta à epidemia de HIV/AIDS no Brasil e no mundo. Inclusive, foi nessa época que a sigla LGBT passou a ser utilizada e o movimento fortaleceu a atuação política. Com a virada do milênio e a internet, a discussão ficou ainda maior; um dos marcos é o primeiro post na comunidade “I Am Pansexual” na plataforma Live Journal em 2002. Oito anos depois, foi criada a bandeira pansexual mais aceita até hoje, que consiste em três listras: uma rosa, representando a atração por pessoas que se identificam com espectros da feminilidade; uma amarela, para identidades não-binárias e uma azul, para pessoas que se identificam com espectros da masculinidade. Ou seja, se organizar direitinho, todo mundo se ama <3.

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