Imagine um mini festival de música eletrônica com os DJs de algumas das principais festas independentes de São Paulo tocando sets inéditos sobre trios elétricos, que rodarão pelo centro da cidade durante seis horas. Agora, adicione centenas de milhares de pessoas fantasiadas e banhadas de glitter ao clima desenfreado da folia paulistana. Pronto, assim será o SP Beats, evento que fará sua segunda incursão no carnaval na próxima terça-feira, 13/02.
A proposta do SB Beats é reunir diferentes coletivos musicais, valorizando músicas originais da metrópole num ambiente pró-diversidade. Também há a chamada para o debate sobre ocupação do espaço público [tema que Emerge Mag abordou na matéria Qual será o futuro da Mamba Negra].
O SP Beats contará com dois carros de som e uma pista fixa. A primeira carreta, batizada de Apolo, terá Cashu e Benjamim Salum (DJs da Mamba Negra), Tata Ogan (DJ e produtora carioca dedicada à música afro-brasileira e eletrônica independente), Zopelar (produtor musical residente da festa ODD e integrante de diversos projetos underground), Bandida Coletivo (formado exclusivamente por mulheres DJs da cena bass) e Thiago Guiselini (residente da festa SoulSet). A concentração terá início às 15h, na Praça da República. Depois, o trio segue pelas avenidas São Luís e Xavier de Toledo, passando pelo Theatro Municipal e Largo do Paissandu. A dispersão começa às 22h.
O segundo carro, nomeado GopsLock, trará os DJs TYV, Gui Scott e Caio T. (da festa Gop Tun) e Paulo Tessuto, Max Underson e Ella de Vuono (da Carlos Capslock).
O fuzuê começa na Praça do Patriarca, onde também haverá uma pista fixa, que funcionará entre 17h e 22h. O trio sai às 18h e circulará pelas ruas São Bento, Miguel Couto, Álvares Penteado e da Quitanda. O fim do baile se dá novamente na Praça do Patriarca.
De acordo com Tessuto, fundador da Capslock, o festival expande o impacto das festas independentes e a atuação dos coletivos junto ao público.
Ele também afirma que a Praça do Patriarca é uma região subutilizada e com pouca ocupação residencial, o que evita reclamações sobre o volume da música, que é um problema recorrente para os organizadores de festas de rua. Por último, o DJ comenta o panorama carnavalesco:
“A música eletrônica já ganhou espaço relevante no carnaval de rua de São Paulo, com blocos que exploram diferentes vertentes musicais e que atendem a uma parcela grande do público”
RESISTÊNCIA ARTÍSTICA
Neste ano, o SP Beats terá como tema o Arte Resiste, conceito que dialoga com o conturbado momento de censura contra manifestações artísticas na cidade. A missão de materializar a proposta no palco e nas carretas ficou sob responsabilidade dos cenógrafos Fabian Alonso, Barão Di Sarno e Heloisa Sobral.
Eles buscaram referências no mundo das artes, como na série de esculturas Bichos, de Ligia Clark, e nos Parangolés, de Hélio Oiticica. As duas criações têm em comum a característica de serem obras vivas, que são manuseadas pelo expectador, que deixa de ser um sujeito passivo durante a fruição.
Há também elementos inspirados nas estruturas de andaime do Teatro Oficina, do diretor José Celso, que há duas décadas trava uma disputa a respeito do uso do terreno adjacente ao teatro com Silvio Santos, dono do espaço. O primeiro deseja a criação de um parque; o segundo quer construir prédios residenciais e um shopping, o que, além de poder fomentar ainda mais a gentrificação do centro, comprometeria a iluminação natural do Oficina, que possui arquitetônico premiado e tombado desde 2010.
Por sua vez, os dançarinos que estarão nos blocos também ajudarão a compor o cenário de combate. Seus corpos estarão cobertos por desenhos alusivos ao pixo, numa referência à maré cinza que o prefeito João Dória liderou contra grafiteiros e pichadores no início de seu mandato. Fabian, que falou com Emerge Mag por telefone ao mesmo tempo em que andava de bicicleta pelas ruas da cidade, revela mais detalhes:
“A estrutura da carreta terá bastante material industrial e de construção civil, como lonas, tubos de ferro e telhas de proteção de obras, para dialogar com a especulação imobiliária que atinge São Paulo”
CONTAS A PAGAR
O SP Beats é um projeto da Rua Livre, empresa que desenvolve eventos culturais com foco em grandes cidades. As iniciativas costumam ser motivadas por demandas da população, apoiadas por órgãos públicos e com patrocínio de marcas. Em 2018, a Rua Livre também administra outros blocos, como o Love Fest, que terá shows de Liniker e Linn da Quebrada, e o Beat Loko, dedicado ao rap.
“O carnaval de rua é um grande catalizador de experiências urbanas”, afirma Estêvão Romane, diretor da Rua Livre. “É uma festa gigante, de graça, com público diverso e com desfiles e blocos com viés cultural e político”.
E quais são os desafios para realizar eventos que recebem centenas de milhares de pessoas?
De acordo com Estêvão, a parte mais complicada é a captação de recursos. Uma vez que o evento é gratuito para o público, é necessário conseguir marcas que custeiem os blocos. Neste ano, o SP Beats terá apoio da Absolut, que já atuou sob o tema Arte Resiste em outra campanha. A marca patrocinou a criação de um mural próximo ao Minhocão em que foram retratadas Linn da Quebrada, Assucena Assucena e Raquel Virgínia, em outubro de 2017.
Dessa vez, o SP Beats custará cerca de 350 mil reais. O montante contempla todas as despesas: da criação dos carros à remuneração dos cerca de 200 trabalhadores, incluindo os DJs.
Após o carnaval, Estêvão estuda a possibilidade de realizar outra edição do SP Beats no meio do ano, num modelo similar ao SP na Rua. Ele também quer levar a festa para outras capitais. E, assim, a caravana não para.
IMAGEM: SP Beats 2017 (divulgação)