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O que aprendi sobre inteligência artificial no jornalismo

08/12/2022

Diretora de produto da Emerge, Karoline Pinheiro, comenta aprendizados do curso Inteligência Artificial no Jornalismo, da Polis/LSE e GNI.

Recentemente tive a oportunidade de participar de um treinamento online sobre Inteligência Artificial (IA) para pequenas redações da think-tank de mídia Polis, da London School of Economics (LSE), em parceria com o Google News Initiative. De setembro a novembro de 2022, participei de uma série de masterclasses ministradas por especialistas que trabalham na interseção entre o jornalismo e a inteligência artificial. Além de mim, participaram mais 19 jornalistas de pequenas organizações comunicação das Américas.

Como o leitor já deve ter notado, diversos setores da economia e da vida social têm demandado por recursos de inteligência artificial. Há desde softwares de criação e tradução de textos, chatbots espontâneos e carros autônomos até aplicativos que criam ilustrações para serem usadas nos perfis das redes sociais, este último bastante bombado no momento.

O jornalismo não escapa dessa demanda. Ao mesmo tempo que a aplicação de inteligência artificial no jornalismo tem crescido, ainda há uma lacuna no nível de experimentações com a tecnologia entre as organizações jornalísticas. Tal déficit não se dá, necessariamente, devido a capacidade de recursos (dinheiro, pessoas e tempo) dos veículos jornalísticos. As principais dificuldades são o acesso ao conhecimento – há pouco material de estudo em português, por exemplo – e a falta de intimidade com a lógica computacional, que, na real, é menos complexa do que se parece a primeira vista.

Por tanto, meu objetivo ao participar do curso da Polis/LSE foi o de tornar a IA e seus jargões mais acessíveis para a equipe da Emerge Mag. A ideia é inspirar meus colegas a aprimorar nosso jornalismo e aliviar suas cargas de trabalho com a ajuda da tecnologia.

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METODOLOGIA E EFICIÊNCIA

Em linhas gerais, a Inteligência Artificial é um termo genérico para se referir a sistemas computacionais capazes de aprender com a experiência, se ajustarem a novas entradas de informações e executarem tarefas de modo similar aos humanos. A grande diferença é que as máquinas têm capacidade de processar um grande volume de dados, como reconhecer padrões em poucos segundos.

Entre estudo de casos do uso da Inteligência Artificial no jornalismo que me chamaram atenção, há os de redações que usaram IA para encontrar, produzir e distribuir notícias, melhorar a experiência do usuário e criar novas fontes de receitas. Listei alguns conteúdos, em língua estrangeira (use o software de tradução do seu navegador):

  • Así suenan y de esto hablan los traperos en la playlist de los centennials, do jornal argentino La Nación. Nesta reportagem, jornalistas usaram ferramentas de processamento de linguagem natural (NLP) para analisar as letras de trap, desmitificar conceitos em torno do gênero e compreender do que hablam os artistas deste estilo musical que tem conquistado os jovens argentinos.
  • Build to Last, do BuzzFeed News. É uma série de quatro reportagens investigativas que ganhou o Prêmio Pulitzer de 2021. Aqui, os jornalistas treinaram uma inteligência artificial para comparar várias imagens de satélite e confirmar denúncias de perseguição e prisão de mulçumanos na China.
  • Ferramentas de produção de conteúdo esportivo automatizado, usadas pela Associated Press e ESPN, entre outras. São softwares que usam dados de competições esportivas para escreverem textos que alimentam os portais de notícias.
  • Ferramenta de transcrição de entrevistas e análise de documentos, do Google, tem permitido jornalistas ao redor do mundo a pouparem tempo. Entre outras coisas essa inteligência artificial transcreve entrevistas e criar um documento pesquisável com base em suas gravações.
  • Curadoria de conteúdo, do The New York Times. Com o intuito de apresentar um feed de notícia personalizado aos gostos de cada um de seus assinantes, o jornal americano tem feito experimentações com algoritmos na home do site.
  • Mensuração de engajamento e retenção de assinantes. Uma vez que o jornalismo enfrenta uma crise de sustentabilidade, doações e assinaturas são importantes para manter os pequenos portais de notícias vivos. Nesse sentindo, a Inteligência Artificial tem auxiliado veículos de mídia a prever o cancelamento de assinaturas e manter os leitores engajados.

Em português, indico o guia Como Funciona a Inteligência Artificial, que apresenta uma série de explicações simples e curtas para ajudar a entender o que é IA, como ela funciona e como está mudando o mundo.

De acordo com um relatório do Reuters Institute for the Study of Journalism, a IA é reconhecida pelos executivos de mídia como vital para a produção jornalística e de negócios. De acordo com o levantamento, 85% dos gestores afirma que a IA seria importante para a recomendação de conteúdo, 81% que impulsionaria a automação da redação e 69% que ajudaria na atração e retenção de assinantes e doadores.

HUMANOS E MÁQUINAS

Distopias robóticas em que robôs substituem humanos – ou até mesmo os atacam – são recorrente na ficção científica. Conforme a automação avança, o cenário se torna realidade, menos as mortes #ufa. Humanos que exercem trabalhos repetitivos e burocráticos serão, inevitavelmente, substituídos. Como já disse, não há como competir com ultraprocessadores. Além disso, penso que é necessário capacitar os trabalhadores em tecnologia, tanto para amenizar o nível de desemprego quanto para ter bons profissionais para os empregos do futuro, que está bem próximo.

Não se trata de dizer que acabou para nós. Na verdade, quanto mais digital o mundo se torna, mais necessária e valorizada tende a ser a atuação dos humanos. Vamos sim trabalhar com as máquinas, mas exercendo trabalho intelectual, criativo e empático. O computador é uma máquina binária, que não entende as ambiguidades e diferenças que tornam nós, humanos, humanos. Para a máquina ou se é ou não é (1 ou 0). Para o ser humano, o mundo é um enorme espectro de possibilidades.

Durante um módulo inteiro do treinamento, discutimos que, sem a supervisão humana, a IA pode causar sérios riscos à cidadania e a dignidade humana. Em 2009, por exemplo, a HP teve de revisar o software de seus computadores após acusações de racismo, uma vez os usuários notaram que o rastreamento facial da marca não reconhecia ou seguia os movimentos de pessoas negras. O que faltou no projeto? Provavelmente uma equipe diversa, composta também por negros e negras.

Mais recentemente o The Intercept, em parceria com Conectas, Data Privacy Brasil e Data Labe, mostrou que plataformas de inteligência artificial têm discriminado mulheres, idosos e pessoas com formação em faculdades populares em processos seletivos.

Entenda: a IA é um algoritmo – e um algoritmo obedece a uma determina perspectiva, um jeito de ver o mundo, baseada em cálculos matemáticos. Daí na necessidade fomentar a diversidade e pluralidade de perspectivas no universo da IA.

Por fim, a experimentação com IA requer equipe, infraestrutura computacional, tempo e dinheiro – e também sensibilidade, diversidade e ética. Em breve, a Emerge Mag usará sistemas de Inteligência Artificial determinados processos, externos e internos. Felizmente, humanidade é algo que nunca nos faltou.

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