Hibridismo e feminismos nas artes plásticas em nova exposição

17/04/2025

Máquinas, humanos, animais, plantas e entidades espirituais são temas de exposição de artistas plásticas, na Galeria Diáspora, em São Paulo.

Efe Godoy é uma artista plástica natural de Belo Horizonte, Minas Gerais. Com 11 anos de experiência, ela se considera uma fazedora de imagens, sobretudo imagens de hibridez. Enquanto uma pessoa trans, o que encanta Efe é justamente a mistura de natureza — seja humano e animal, seja animal e planta —, que transborda em suas pinturas em aquarela e desenhos.

Na série A cada vez que eu esqueço de dizer algo, brota um pensamento novo que pode ser esquecido outra vez, produzida entre 2024 e 2025, Efe apresenta fotos antigas, garimpadas em antiquários. Após rasgá-las, ela cria desenhos de plantas a partir das fissuras.

Composta por 10 fotografias-desenhos, a série faz parte da exposição Territórios Diluídos, da Galeria Diáspora, em cartaz até o dia 17 de maio, na capital paulista.

EFE GODOY: mistura de humanos e plantas em fissuras de fotografias antigas (Foto: Kalinca Maki)

LEIA MAIS: Além do pincel: mulheres que rompem barreiras nas artes visuais.

A exposição é baseada no ensaio Manifesto Ciborgue, da filósofa e zoóloga americana Donna Haraway. O texto discute a relação entre ciência, tecnologia e feminismo socialista, e propõe uma nova visão sobre a natureza humana.

Com a obra publicada em 1985 na mente e no coração, as curadoras Ana Carla Soler e Marina Frúgoli selecionaram nove artistas mulheres com trabalhos que entrelaçam as temáticas.

Ana e Marina afirmam que o projeto para a exposição surgiu de um interesse comum das duas. Durante vários encontros, elas realizaram aproximações estéticas de artistas que tinham pesquisas sobre a presença feminina no sistema das artes e também sobre corpo, espaço, cidade e questões indígenas.

CURADORIA: corpo, espaço, cidade e questões indígenas.

Logo, elas começaram a listar artistas que tinham produções próximas da ideia de hibridismo e metamorfoses.

Territórios Diluídos conta com artistas representadas e não representadas por galerias. A exposição se propõe estar no sistema das artes com trabalhos de pesquisas consolidadas e artistas que buscam transitar por diferentes formas de expressão.

Assim como outras iniciativas da Galeria Diáspora, Territórios Diluídos questiona e desafia as estruturas tradicionais do mercado de arte, ampliando o acesso e a visibilidade a novas narrativas e propostas inovadoras.

Vale destacar que a galeria tem um programa de abertura de espaço para novos artistas e novos compradores e colecionadores de arte contemporânea.

NARRATIVAS BÍBLICAS E MITOLÓGICAS

Artista da mostra, Bruna Amaro costuma se debruçar sobre a representação feminina nas liturgias bíblicas e mitológicas, principalmente as greco-romanas. Ela conta que o ponto de partida da sua pesquisa veio do próprio descontentamento com a ausência de mulheres vitoriosas na história da arte. Do incômodo, ela chegou a história de um dos símbolos de vitória mais famoso do ocidente: a coroa de louros.

Ela encontrou a resposta numa história mitológica. Numa disputa entre Apolo, deus das artes, música e medicina, e Cupido, o pequeno deus do amor, o segundo utiliza uma flecha encantada para fazer o primeiro se apaixonar pela ninfa Dafne. Porém, Cupido usa outra flecha em Dafne, que a faz sentir repulsa de Apolo.

Cansada da perseguição de Apolo, a ninfa pede para seu pai a transformar numa planta, e se torna um loureiro. Insatisfeito com a rejeição, Apolo arranca galhos da árvore para fazer sua coroa, que se torna, então, a sua marca.

“O que mais me impressionou na história da coroa de louros é que um símbolo de vitória tem origem num ato de violência contra uma mulher.”

Bruna Amaro, artista plástica.

Em Territórios Diluídos, Bruna apresenta a obra Jael, de 2025. Ela explica que, no Livro de Juízes, do Primeiro Testamento e da Bíblia Hebraica, Jael é uma mulher que se voluntariou para dormir com Sísera, militar que liderava um exército contra os hebreus. Com intenção de cessar os ataques, Jael aproveita o sono do militar para matá-lo.

Em Jael, a artista plástica utiliza diferentes materiais e costura manual para representar a heroína com a cabeça do inimigo nas mãos [veja a artista e a obra na foto de abertura desta reportagem].

ESCOLHA: artes digitais de Guilhermina Augusti.

MÁQUINAS, HUMANOS, ANIMAIS, PLANTAS E ENTIDADES ESPIRITUAIS

Doutora e mestre em artes visuais, a artista plástica Yoko Nishio também participa de Territórios Diluídos, com Indexados, de 2020. A série de pinturas de óleo sobre tela apresenta partes de rostos de diferentes pessoas, como acontece numa reunião online. A curadora Ana Carla reflete sobre a obra:

“No mundo digital, bidimensional, a gente continua sendo gente? Nosso corpo ainda é lido como um conjunto? Imagens fragmentadas, de pequenas partes de nós, dizem quem somos?”

Ana Carla Soler, uma das curadoras de Territórios Diluídos.
INDEXADOS: série representa rostos durantes reuniões online.

Já Moara Tupinambá, artista natural de Maery, Belém do Pará, apresenta na exposição o quadro Yara, recém-produzido. A obra representa o ser de histórias ancestrais dos Tupinambás, parte mulher e parte peixe, que vive nos rios e seduz homens.

Por sua vez, a artista plástica Cristina Suzuki questiona, assim como Yoko, se a parte do todo também nos define. Figura 1 e Figura 1 espelhada e alternada é uma série de carimbos com tinta acrílica de piso sobre placa de MDF.

Com o trabalho Escolha, lançado em 2019, Guilhermina Augusti explora as infinitas possibilidade de ser, a partir de diálogos com animais selvagens.

SERVIÇO

Exposição Territórios Diluídos
Curadoria: Ana Carla Soler e Marina Frugoli.
Até 17 de maio.
Galeria Diáspora. Av Rebouças, 2915, Pinheiros, São Paulo/SP.
Ter e Qua – sob agendamento | Qui e Sex – 11h às 19h | Sáb – 11h às 16h.
Entrada gratuita.

FOTOGRAFIAS: Kalinca Maki.

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