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Hortas comunitárias no combate às mudanças climáticas

10/11/2023

Hortas comunitárias e a agroecologia urbana são soluções simples para problemas causados pelas mudanças climáticas.

As mudanças climáticas são uma realidade. Em setembro, por exemplo, São Paulo registrou temperaturas que o levaram o ser o mais quente da história. De acordo com a MetSul Meteorologia, o Brasil terá, ainda em novembro, uma nova onda de calor, com elevação de temperatura extrema em vários estados e uma alta probabilidade de quebra de recordes históricos

Como em todas as tragédias da história da humanidade, é a parcela mais pobre que sente os efeitos mais graves. Os causadores e responsáveis pelo aquecimento global, por outro lado, estão posicionados a nível macro e no topo da pirâmide social. É a parcela dominante que comanda a contínua exploração de combustíveis fósseis, as grandes indústrias, o extrativismo desenfreado de minérios, entre outros pontos.

Apesar de não carregarem a culpa e nem o controle do que pode de fato impedir o aquecimento da terra, a periferia está, há tempos, desenvolvendo e colocando em prática soluções sustentáveis, na tentativa de amenizar o problema.

Uma dessas ideias são as hortas comunitárias. Além de serem momentos compartilhados de cuidado e trazerem mais verde e sustentabilidade para a periferia, os espaços dedicados para o cultivo de vegetais, frutíferas e ervas ajudam na alimentação mais saudável, geram renda e atuam no propósito pedagógico.

VOLUNTÁRIOS NA HORTA JD. GUARANI: BRASILÂNDIA, DISTRITO DA ZONA NOROESTE DE SÃO PAULO, POSSUI 20 HORTAS COMUNITÁRIAS (Foto: Rafael Felix)

LEIA MAIS: Por que a alimentação saudável ainda é um privilégio?

SUSTENTABILIDADE COMPARTILHADA

O distrito da Brasilândia, na zona noroeste de São Paulo, concentra boa parte das áreas rurais restantes e é um dos mais ocupados da cidade. São cerca de 12 mil habitantes por quilômetro quadrado. Para efeitos de comparação, a cidade de São Paulo, inteira, com uma população 42 vezes maior, tem pouco mais de 7 mil habitantes por quilômetro quadrado. 

O cenário de ocupação desproporcional faz das hortas comunitárias pontos de convergência e de soluções emergenciais. De acordo com a plataforma Sampa Mais Rural, são 20 hortas comunitárias no distrito.

Elas se organizam em rede com outras iniciativas e organizações locais para proporcionar atividades de formação para crianças e jovens, conscientização e preservação ambiental e geração de renda para mulheres. Além desse trabalho comunitário, as hortas por si só são uma forma prática de inibir efeitos da crise climática, como as ilhas de calor e a escassez de água potável, além de facilitarem o acesso a alimentos saudáveis.

Na horta de Jardim Guarani, fui recebido por Hilda Cardoso, gestora do espaço. Localizado ao lado da UBS da comunidade, o espaço pega parte de uma colina, com uma área aberta para as hortaliças e frutíferas e outra com árvores de jatobá e jaca.

HILDA CARDOSO, GESTORA DA HORTA JD GUARANI: CONHECIMENTO TRADICIONAL E ANCESTRAL (Foto: Rafael Felix)

Desde 2018, a horta comunitária produz alimentos, como tomate, alface, espinafre, beterraba e outros vegetais, e plantas usadas como tempero, como açafrão, manjericão, hortelã e pimenta. Hilda conta que muitas das ervas nasceram só com a água da chuva. Algumas têm propriedades medicinais, como aroeira, arruda, fafia, entre outras. Reconhecer e cuidar dessas plantas, segundo Hilda, é um conhecimento tradicional e ancestral, mas que infelizmente está se perdendo

Daí a importância das atividades educativas, realizadas pela administração dessas hortas comunitárias em parceria com escolas e a comunidade. O projeto de Hilda, por exemplo, organiza visitas de estudantes da região, que aprendem sobre meio ambiente, saúde e agricultura, enquanto têm contato com a natureza e o manejo da terra.

HORTAS COMUNITÁRIAS SÃO FONTE DE RENDA PARA MULHERES DE PERIFERIAS (Foto: Rafael Felix)

A horta se mantém com trabalho voluntário e arrecadação de recursos entre a própria comunidade do Jardim Guarani. Nas terças-feiras, das 9h até 12h, os voluntários fazem uma feira para vender os alimentos produzidos a um preço acessível.

“A proposta da horta é promover uma alimentação saudável aos moradores, oferecer educação ambiental para crianças e gerar renda para nós, mulheres da comunidade”

HILDA CARDOSO, GESTORA DA HORTA JD. GUARANI

O dinheiro arrecadado é investido na manutenção, já que a prefeitura garante apenas o uso do espaço para a horta. Custos como restauração do solo ou de conservação do espaço – o corte de uma árvore apodrecida, por exemplo – são pagos com os valores da feira.

Os desafios administrativos aparecem em outros formatos. Outra horta comunitária da região, localizada no Centro de Educação Unificado (CEU) Jardim Paulistano, foi desligada de repente, em setembro deste ano, pela diretoria da escola. Implementada durante a pandemia, de forma voluntária por uma funcionária da escola, o espaço era destinado para propósitos educativos para os alunos.

VEJA TAMBÉM: Mobilidade sustentável: ciclo entregas nas periferias

A CIDADE PRECISA DE VOCÊ

Com intuito de ativação de espaços públicos urbanos para soluções socioambientais, o instituto A Cidade Precisa de Você trabalha com projetos como os das hortas comunitárias. Atuando como intermediador entre comunidades locais, movimentos civis, empresas e o poder público, a organização tem contribuído para as hortas no distrito da Brasilândia.

MARCELLA ARRUDA, PRESIDENTE DO INSTITUTO A CIDADE PRECISA DE VOCÊ (Foto: Rafael Felix)

Marcella Arruda, arquiteta, urbanista e presidente do instituto, vê muitos benefícios ambientais com as hortas urbanas, como a recuperação do solo, a captação de carbono e a diminuição do calor. Há também benefícios sociais, como espaços públicos para cuidar da saúde mental e física, além da produção de alimentos saudáveis.

Mas, na visão da presidente, só as ações comunitárias de pauta ambiental não são o suficiente. É preciso estender para as iniciativas pessoais, como a compostagem doméstica, que podem contribuir para a redução da poluição de aterros e a proteção do solo.

“Só as hortas não bastam: é preciso ter distribuição desses alimentos com feiras e cozinhas solidárias. Também é necessário mais educação e troca de conhecimento, além de criar pontos de cultura alimentar”

MARCELA ARRUADA, PRESIDENTE DO INSTITUTO A CIDADE PRECISA DE VOCÊ

Para ela, em relação às iniciativas agroecológicas, a atitude da prefeitura de São Paulo tem mudado para melhor nos últimos anos. Marcella cita como exemplo o Programa Operação Trabalho (POT) Mães Guardiãs, um projeto de estruturação e administração de hortas escolares por mães de alunos da rede municipal de ensino.

Outras ações agroecológicas, como Sampa+Rural, disponibilizam assistência técnica e insumos para criação de novos projetos. Porém, segundo Hilda, meios de assistência jurídica na gestão compartilhada desses espaços também seriam necessários para melhor coordenação. Ela também cita a necessidade de um apoio logístico, como um meio de transporte para materiais e insumos. 

VOLUNTÁRIAS E EQUIPE DO INSTITUTO A CIDADE PRECISA DE VOCÊ: COCRIAÇÃO EM SOLUÇÕES DE URBANISMO SOCIAL (Foto: Rafael Felix)

Marcella reforça e pontua que o poder público precisa intensificar o trabalho de agroecologia urbana. Ela cita como exemplo estudos do solo em espaços públicos ociosos, em parceria com universidades e institutos de pesquisa, e direcionar os terrenos possíveis para mais hortas comunitárias na cidade.

“Este conteúdo faz parte da campanha Planeta Território, uma iniciativa do Território da Notícia com apoio do Instituto Clima e Sociedade (iCS)”

Quem escreveu

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Guilherme Schanner

Graduado em jornalismo pela Universidade Mackenzie, gosta de escrever e falar sobre cultura e sustentabilidade. Apaixonado pela natureza, é líder escoteiro desde a infância. Com experiência em produção e edição de conteúdo digital, trabalhou no Fala! Universidades.

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