No Brasil, cerca de 10% da população feminina com 2 anos ou mais convive com algum tipo de deficiência, segundo dados do IBGE. Em números absolutos, isso representa aproximadamente 10,7 milhões de mulheres, mais da metade do total de pessoas com deficiência (PCDs) no país.
Apesar dos desafios diários, muitas delas escolhem vivenciar a maternidade, enfrentando não apenas os limites impostos por suas condições físicas ou sensoriais, mas também o preconceito estrutural e a ausência de acessibilidade nos serviços públicos e privados.
Além dos graves problemas de falta de acesso ao trabalho e educação, é comum mulheres com deficiência enfrentarem questionamentos sobre seus corpos e suas capacidades. A discriminação, inclusive, se dá de forma sutil.
De acordo com a especialista em diversidade e inclusão Aline Messias, que também possui paralisia cerebral e é mãe, é comum as pessoas se referirem a PCDs com diminutivos, como “bonitinhos” ou, no caso dela, “Alininha”.
“Embora possa ser interpretado como uma demonstração de carinho, chamar pessoas com deficiência no diminutivo é uma forma de infantilizá-las, que reforça estereótipos de incapacidade.”
Aline Messias, mãe atípica e especialista em diversidade e inclusão.
Tal forma de capacitismo, como é chamada a discriminação e o preconceito contra pessoas com deficiência, também coloca PCDs em posições de subordinação, o que retira o seu poder de decisão e autonomia.
Neste Dia das Mães, com o propósito de dar visibilidade e fortalecer o protagonismo feminino, especialmente entre aquelas que enfrentam múltiplas camadas de exclusão, conheça a história de seis mulheres com deficiência que exercem a maternidade com coragem, afeto e resistência. Com diferentes idades e ocupações, todas usam as redes para compartilharem suas rotinas e reflexões.
LUCIANA VIEGAS
Educadora e ativista brasileira, atua na interseção entre os direitos de PCDs, antirracismo e a inclusão social. Autista e mãe de um filho autista não-verbal, teve seu diagnóstico aos 25 anos, após perceber que compartilhava características com seu filho. Em 2020, fundou o movimento Vidas Negras com Deficiência Importam (VNDI Brasil). No ano seguinte, representou movimentos de direitos das pessoas com deficiência ao falar, no Supremo Tribunal Federal, contra o Decreto 10.502/2020, que reforçava a segregação na educação brasileira. Em 2022, foi incluída na D-30 Disability Impact List, ranking global de PCDs notáveis. Foi finalista do Prêmio Inspiradoras 2023, na categoria Equidade de Gênero e Liderança. Atualmente, é colunista da Revista Autismo e atua como intérprete de Libras.
FLÁVIA CINTRA
É jornalista e repórter do Fantástico, da TV Globo. Aos 18 anos, sofreu um grave acidente de carro que a deixou tetraplégica. A maternidade chegou anos depois, aos 34 anos, quando ela deu à luz gêmeos. Sua trajetória inspirou a personagem Luciana, interpretada por Alinne Moraes, na novela Viver a Vida, em que atuou como consultora. É coautora do livro Maria de Rodas, no qual compartilha relatos sobre a maternidade na perspectiva de mulheres com deficiência. O livro propõe um mergulho sensível e apaixonado em um mundo que, segundo as autoras, é tão igual e tão diferente.
EDUARDA CAROLINY
Vive com paralisia cerebral desde os três meses de idade. É mãe do pequeno Luiz Carlos e compartilha sua rotina nas redes sociais, principalmente no Instagram e TikTok, onde acumula mais de 1,6 milhão de seguidores. Em seus vídeos, Eduarda aborda temas como maternidade, inclusão e os desafios enfrentados por pessoas com deficiência. Desmistifica preconceitos e mostra que a deficiência não impede uma vida plena e afetiva, como alimentar, trocar fraldas e brincar com o filho. Seu conteúdo mostra que o amor e o cuidado não dependem de padrões capacitistas.
ALINE MESSIAS
Palestrante e especialista em diversidade e inclusão, vive com paralisia cerebral. Mãe do pequeno Rafael. Compartilha nas redes sua vivência como mulher com deficiência e maternidade atípica. Em um vídeo no TikTok, por exemplo, conta sobre as dificuldades que enfrenta, como as barreiras físicas e falta de acessibilidade. Em 2023 e 2024, foi reconhecida no Criadora de Conteúdo do Ano, no Prêmio ABC de Comunicação. Sua presença online tem sido fundamental para a conscientização sobre a importância da representatividade de mulheres com deficiência na sociedade. Fora das redes, tem carreira de mais de 13 anos na Natura, onde analista de sustentabilidade.
NATÁLIA EVELYN DOS SANTOS
Vive com artrogripose, uma condição rara que limita os movimentos dos membros superiores e inferiores. Frente às limitações físicas, aprendeu a realizar diversas atividades com a boca, como escrever, cozinhar e cuidar dos filhos. Casada com William há mais de 15 anos, é mãe de Vitória, 13, e Davi, 8, que tem hidrocefalia e autismo nível 3 de suporte. Desenvolve trabalho criativo por meio de criações de lettering (arte de desenhar letras com composições únicas e personalizadas). Sua história foi registrada pelo Museu da Pessoa, onde relata os desafios enfrentados desde a infância, as cirurgias realizadas e a luta por inclusão e respeito. Natália aceita doações (contribua aqui).
SUH CALIXTO
Cadeirante, vive com a doença de Charcot-Marie-Tooth, uma distrofia muscular que afeta principalmente os membros inferiores, mas também pode comprometer outras partes do corpo, como as mãos e as cordas vocais. Desde os 16 anos, usa cadeira de rodas e compartilha sua rotina com muito humor e autenticidade. Seus vídeos trazem histórias cotidianas, como as dificuldades que PCDs enfrentam ao tentar chamar um carro via aplicativo. Ela relata que alguns motoristas se recusam a transportar sua cadeira de rodas. Embora aborde desafios, seus vídeos costumam ter viés de bom humor.