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O que aprender com a arquitetura paraguaia?

03/01/2020

Livro “Arquitetura contemporânea do Paraguai” mostra alternativas que podem solucionar problemas urbanos do Brasil com foco na responsabilidade social e uso de materiais sustentáveis

Livro “Arquiteturas Contemporâneas no Paraguai” mostra alternativas que podem solucionar problemas urbanos do Brasil com foco na responsabilidade social e uso de materiais sustentáveis

Expulsos do lar, sem dinheiro e vivendo às margens de seu país, uma mãe e três crianças não têm onde morar. Sensibilizado pela situação da família, o arquiteto José Cubilla oferece ajuda, mas, sem recursos, tem que pensar em um material barato que, além de servir para construir uma boa casa, também deve proporcionar qualidade de vida.

Nesse momento, José entende que o mesmo chão que suja seus sapatos pode ser matéria prima de suas construções. A terra, agora, compõe as paredes de um novo lar que se tornou um exemplo de arquitetura descolonizada.

Essa história, contada pela arquiteta paraguaia Violeta Pérez no evento de lançamento do livro “Arquiteturas Contemporâneas no Paraguai”, ilustra o quanto o Brasil tem a aprender com a arquitetura do país vizinho.

LIVRO PROMOVE O INTERCÂMBIO ENTRE ARQUITETURAS LATINO-AMERICANAS

A obra, que contém textos críticos e uma seleção de 29 obras, foi organizada pela Goma Oficina, coletivo de arquitetos e artistas que desde 2010 trabalha com frentes interdisciplinares com foco no viés crítico e artístico.

O livro, em edição bilíngue (português-espanhol), é resultado da aproximação entre arquitetos e fotógrafos brasileiros e paraguaios e revela as virtudes e a criatividade de uma nova geração de arquitetos.

O evento de lançamento do livro aconteceu no Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), lozalizado na região central de São Paulo. No mesmo ambiente, está instalado o café Bento 43, que permaneceu aberto durante o evento.

No encontro, houve uma mesa de discussão composta por Violeta Pérez e os arquitetos brasileiros Angelo Bucci e Pedro Peresin.

Os assuntos abordados exprimiam um novo olhar sobre um país, seu território e suas cidades, bem como a importância da responsabilidade social e do uso de materiais sustentáveis, adequados para o contexto latino americano.

De acordo com Guido Otero, diretor do IAB, a obra também reforça a importância de promover o intercâmbio entre arquiteturas latino-americanas. Ele comenta:

“O livro Arquitetura Contemporânea do Paraguai pode ajudar com que os países da América Latina deixem de ter a Europa como exemplo arquitetônico e passem a olhar para os países vizinhos em busca de inspiração”

LEIA MAIS: Onde estão as arquitetas negras?

ARQUITETURA DECOLONIAL

Para desenvolver uma arquitetura decolonial é necessário que um país se desprenda de uma prática arquitetônica e urbanística hegemônica, exclusiva, mercantilizada e colonial.

O romancista paraguaio Roa Bastos define seu país como “uma ilha cercada de terra […], um país completamente fechado às nocivas e permissivas influencias forâneas”.

Não por acidente, foi nessa “ilha” que emergiram trabalhos de arquitetos como Solano Benitez, Javier Corvalan, José Cubilla e Luis Elgue. Eles observaram seu próprio território e buscaram nele diferentes alternativas e práticas inovadoras, material, social e economicamente.

Falando em Benitez, ele é o criador do projeto do edifício que abriga a sede do Teletón, um centro destinado ao auxílio no tratamento de pessoas com mobilidade limitada (o prédio pode ser visto na foto que abre essa reportagem).

São nessas novas práticas que o Brasil pode procurar inspiração para começar a fazer uma arquitetura “onde está e a partir do que existe”, como disse Samuel Mockbee ao se referir a arquitetura como uma arte social.

Segundo dados do IBGE de 2010, no Brasil, as cidades médias são as que mais prosperam em relação à média de crescimento nacional. Nesse cenário, a tendência é que elas sejam influenciadas pelo modelo de desenvolvimento das metrópoles, as quais, por sua vez, possuem graves problemas urbanos, que afetam a qualidade de vida da população.

Maria Cau Levy, arquiteta da Goma Oficina, observa:

“As problemáticas que o Paraguai enfrenta hoje são equivalentes aquelas vividas pelas cidades médias brasileiras. Por esse motivo, é importante olhar para o Paraguai. Os arquitetos incríveis desse país, reconhecidos nacional e internacionalmente, encontraram soluções inventivas e adequadas para América Latina”

A arquiteta Tânia Knapp, que adquiriu um exemplar do livro, acredita que o evento foi importante para a divulgação de produções latino americanas e serviu para ampliar o conhecimento geral de estudantes e arquitetos.

Ela diz que o livro é uma oportunidade de desconstruir os maneirismos que os arquitetos brasileiros carregam de formação e uma maneira de recordar o que já não têm mais, como a cultura dos povos originários e a valorização do vernacular (uso de materiais e recursos do próprio ambiente em que a edificação é construída), que são referências esquecidas hoje em dia.

EVENTO DE LANÇAMENTO DA OBRA ACONTECEU NO INSTITUTO DE ARQUITETOS DO BRASIL

“Além disso, o livro nos fez olhar para as possibilidades de construir para além da industrialização”, diz Tânia.

Por sua vez, o mestre em arquitetura Felipe Rodrigues encara o livro como um passo para a construção de uma escola arquitetônica paraguaia.

“Essa publicação tem um valor muito importante porque a arquitetura do Paraguai é algo que existe, mas que está rarefeita”, diz Felipe. “O livro a consolida, fazendo essas ideias navegarem para muito mais longe do que a capacidade das pessoas visitarem o Paraguai e verem por elas mesmas”.

A geração de arquitetos paraguaios que compõe o livro mostra que a melhor inovação é aquela que surge a partir do reconhecimento da situação socioeconômica de um país. Esses arquitetos subvertem o status quo, ao negarem as soluções high-tech e os processos industriais.

Eles defendem, antes de tudo, uma arquitetura que se importa com a qualidade de vida.

SERVIÇO
Livro Arquiteturas Contemporâneas no Paraguai
Textos: Eduardo Verri, Fernando Lara, Javier Alcalá, Lena Império Hambuguer, Maria Claudia Levy, Pedro Beresin e Vitor Pena.
Fotografias: Federico Cairolli, Lauro Rocha, Leonardo Finotti, Leonardo Mendez e Pedro Kok.
Coordenação: Goma Oficina
Edição: Romano Guerra e Escola da Cidade
Páginas: 176
Preço: R$ 70,00

Café Bento 43
Um café-varanda no IAB-SP.
De segunda a sábado, das 11h às 22h.
Siga o Bento 43 no Instagram.

IAB São Paulo
O Instituto de Arquitetos do Brasil é uma entidade sem fins lucrativos que se dedica a temas essenciais ao arquiteto, à cultura arquitetônica e urbanística e à sociedade. Acompanhe as novidades do IAB SP no Instagram e saiba mais no site.

Diálogos e Café
Diálogos e Café é a editoria da Emerge Mag fruto de uma parceria com o Jardin do Centro, que congrega a marca homônima; o Quintal do Centro; o Bento 43 e a Quadra 27. A parceria de mídia consiste, principalmente, na cobertura de eventos culturais, artísticos e de viés social, de diferentes vertentes.

FOTOS: Geo Gomes e Federico Cairoli.

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