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Sabe para que serve um vereador? O 3 Palitos ensina.

14/11/2020

Coletivo de educação política utiliza jogos de tabuleiro e oficinas para aumentar a participação cidadã nas decisões do legislativo municipal

Coletivo de educação política utiliza jogos de tabuleiro e oficinas para aumentar a participação cidadã nas decisões do legislativo municipal

Em véspera de eleições, é comum ver candidatos a vereadores prometendo soluções para todos os problemas do bairro. É aquela coisa de “vamos colocar boa iluminação nos postes, tapar os buracos nas ruas e levar água encanada para todos os domicílios”. Entretanto, será mesmo os vereadores têm esse poder? Nesses casos específicos, a resposta é “não”. Por exemplo, obras e melhorias de infraestrutura, como recapeamento do asfalto, são da responsabilidade do poder executivo municipal, ou seja, dos prefeitos. Por sua vez, ações de saneamento básico são da responsabilidade do poder executivo estadual: o governador do estado.  

Ixi, então para que serve um vereador? Os vereadores são membros do poder legislativo municipal e suas principais funções são: representar segmentos da população na câmara municipal; criar leis que tornem a sociedade mais justa; fiscalizar as finanças e a execução orçamentária e julgar as contas do município e a administração do prefeito. Por exemplo, se um prefeito cometer vacilos no mandatado, os vereadores podem votar por sua cassação.

Para ensinar esses e outros conceitos é que existe o 3 Palitos, coletivo de educação política apartidário que promove participação cidadã na política. A grande sacada do coletivo é usar jogos de tabuleiro, oficinas e dinâmicas para apresentar as ferramentas e os caminhos que população, de forma organizada, pode identificar os atores-chave, incluir suas pautas e pressionar e acompanhar as decisões do município – tudo isso no dia a dia e não apenas de quatro em quatro anos.

Um dos jogos desenvolvidos pelo coletivo é o Passa Lei, que mostra como funciona a tramitação de projetos de leis no legislativo para que a população saiba pleitear a criação de políticas públicas. O jogo de tabuleiro foi feito com materiais de baixo custo, como papel e cartões plastificados e já rodou com oficinas em diversas unidades do Sesc e entidades do terceiro setor, como a Ação Educativa e a Oficina Municipal.

Como o cenário político institucional brasileiro é conturbado e controlado por pequenos grupos de poderes, podemos achar que tais iniciativas populares tendem a ser insignificantes – mas não é bem assim. Vale lembrar que a famosa Lei da Ficha Limpa surgiu de uma mobilização popular, que angariou mais de 1,6 milhão de cidadãos como vocês, leitores. A lei, que completou 10 anos em 2020, impede a candidatura de políticos condenados por crimes como improbidade administrativa, lavagem de dinheiro e abuso de autoridade.

Já que entramos no tema “corrupção”, outro foco do 3 Palitos é mudar o senso comum de que política é assunto apenas da esfera institucional e sinônimo de roubalheira. A política está presente até nos mais singelos e pequenos acordos entre os seres humanos. Sabe aquela negociação com u namorade na hora de escolher qual filme o casal verá na noite de sábado? Isso também é política.

Um caso que exemplifica esse lance surgiu numa oficina que o 3 Palitos realizou numa escola pública de São Paulo. Na dinâmica, os alunos precisaram identificar causas que eram comuns em toda a escola. Uma das demandas foi que as alunas queriam usar shorts iguais aos permitidos para os meninos. A partir daí, elas se organizaram internamente e contataram outras alunas de escolas da região e criaram uma petição na plataforma Avast. Com centenas de assinaturas, conseguiram implementar um novo conjunto de uniforme para a escola, que contemplava shorts para elas. Sobre o caso, o coletivo explica:

“Percebemos que as pessoas não têm conhecimento sobre os caminhos de participação cidadã na política institucional e muitas dão de ombros e vinculam política com corrupção. Daí a importância da formação política como instrumento de construção de cidadania e participação social”

AQUELES JOVENS QUE QUEREM MUDAR O MUNDO

O 3 Palitos é formado por quatro jovens com menos de 30 anos, todos com graduação em jornalismo, mas que seguiram caminhos diversos. São eles: Gerson Camargo, mestre em educação; João Almeida, que trabalha com produção de conteúdo e gestão de redes sociais; Felipe Neves, repórter da TV Cultura; e Alexandra Papini, analista política que atua em relações governamentais e advocacy.

Fundado em fevereiro de 2016, a dificuldade inicial do coletivo foi construir sua sua identidade, sua missão e suas linhas de atuação. Naquele ano, havia acontecido golpe que tirou a presidenta Dilma do poder (“o grande acordo nacional com o Supremo, com tudo”). O país estava super polarizado e diversos agentes públicos tentavam capitanear a insatisfação popular para chegar ao poder. Em 2019, a situação foi elucidada por um estudo da organização americana Pew Research Center, que avaliou a satisfação da população com a democracia em 27 países. De acordo com o levantamento, 83% dos brasileiros estavam insatisfeitos — valor 32% maior do que a média global (51%). De acordo a Pew Research Center, a insatisfação estava relacionada com a frustração econômica, o cerceamento de direitos individuais, o tratamento que a Justiça dá aos cidadãos e ao senso de que os políticos, além de corruptos, não se preocupam com o povo.

Ao longo de sua trajetória, o 3 Palitos percebeu que seu modelo de oficinas e consultoria em educação e participação popular poderia abarcar outros públicos além de adolescentes e jovens em formação do ensino básico, o foco inicial do coletivo. Eles já realizaram oficinas, por exemplo, para profissionais da área de operações do Clube Pinheiros para fomentar a inserção e engajamento dos funcionários num programa de educação formal da empresa.

Hoje, prestes a presenciar a terceira eleição desde sua fundação, o coletivo está na luta pela sustentabilidade financeira, que permitirá aos integrantes ter dedicação integral ao coletivo (a Emerge está passando pela mesma fase; nos solidarizamos, migs). E eles têm tido devolutivas positivas. Em plena pandemia, quando o desespero tomou conta dos integrantes porque a rede Sesc, o maior parceiro do coletivo, paralisou todas as atividades presenciais, o 3 Palitos não deixou a peteca cair e conseguiu adaptar as oficinas para o ambiente virtual. A tática deu certo e eles fecharam vários trabalhos nos últimos meses. Em outubro, inclusive, realizaram uma série de quatro encontros para o Sesc Pinheiros.

Nesta véspera de eleições municipais, inspire-se na história dos 3 Palitos para refletir sobre a cidade que você deseja e como pode criá-la. E, ao sair de casa para votar, não se esqueça da máscara, o título de eleitor e a classe social à qual pertence – aí é apertar o verde e sucesso.

FOTOGRAFIAS: Kalinca Maki.

Esta reportagem integra o projeto Mapeamento de Coletivos e Produtores Culturais da Região Metropolitana de São Paulo e conta com apoio do Edital ProAC nº 14/2019, de incentivo ao desenvolvimento da cultura popular, tradicional, urbana, negra, indígena e plural no Estado de São Paulo. Veja outras reportagens da série:
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Quem escreveu

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Italo Rufino

Jornalista pós-graduado em marketing com dez anos de experiência. Trabalhou na revista Exame PME (Editora Abril), nos sites Diário do Comércio e Projeto Draft e na ONG de urbanismo social A Cidade Precisa de Você. Natural de Diadema (RMSP). Pai de uma criança de 10 anos. Fundador da Emerge.

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